Tinha combinado de ir na casa do Che a tarde para gravar uns cd's. Eu liguei pra ele e fui. Fiquei pouco tempo. Acabou que nem gravamos cd nenhum. O dia estava esquisito e meu humor também. Fomos para a praça umas 4 e meia da tarde. Liguei para Lis e ela apareceu. No Bar do Geraldo, tomávamos uma cerveja, onde mais umas 10 pessoas faziam o mesmo. De repente, duas cenas se instalaram. De um lado, na frente da igreja, fiéis se juntavam para a procissão. No auto-falante da igreja, o padre chamava a população e rezava a Ave-Maria. Do outro lado, no Bar do Geraldo, aqueles 10, vestidos basicamente de preto, com all stars sujos e rasgados nos pés, conversando e rindo. No auto-falante do aparelho de som, tocava um rock pesado, que nem dava pra identificar qual banda era. O padre passou duas vezes, de batina e tudo, e nos cumprimentou. Nós, Lis, Che e eu, estávamos no meio dos dois cenários. E começamos a conversar sobre religião, Deus, felicidade. A cerveja bateu e tudo ficou mais caótico. Na minha cabeça, as duas peças encenadas ali na praça, em volta de nós, estavam em slow motion. Na nossa turma, o clima esquentou, e antes que fervesse, cortamos o assunto e fomos embora. Fecham-se as cortinas.
A noite teve ensaio, do "Sexo dos Anjos", anjos que aparentemente estavam em mais uma de suas crises, mas era só impressão. Lislaine nem apareceu. Ficamos Che e eu no posto depois, conversando. Tudo ficou no lugar.
Fui pego de surpresa na quarta-feira. Paulo marcou ensaio da peça "Somos todos do jardim da infância". Estou sem computador em casa e fica complicadíssimo montar as coreografias. Saí da biblioteca mais cedo, decidido de que ia fazer o ensaio ser produtivo. Cheguei em casa, me sentei no sofá com o texto no colo. Na cabeça, a ideia de que "sou capaz e vou conseguir criar". Fiz umas anotações em 4 cenas. Saí animado de casa e mal podia esperar chegar a hora de ver as cenas acontecendo. Na quinta-feira, o ritual foi o mesmo. Cheguei da biblioteca e fui estudar o texto. Foram dois dias de ensaios produtivos. 5 cenas novas montadas, agora faltam 23. Teremos 2 dias de ensaio por semana, e depois de montadas as cenas, virão as coreografias. Os deuses do teatro vão nos ajudar e tudo ficará pronto para a estreia no mês que vem.
Comecei a tomar um remédio essa semana, para controlar a ansiedade e fazer com que eu pare de fumar. Reduzi mais da metade do número de cigarros que estava acostumado a fumar, mas ainda não parei. Estou uma seda desde então, calmíssimo. Isso não impediu que Che e eu tivéssemos outro stress na sexta-feira. Coisa boba, pequena, mas nos irritamos muito. Odeio ser mal interpretado e pagar o preço por isso, sem merecer. Che odeia ser acusado daquilo que não fez e ser comparado a outras pessoas. Antes, de manhã, a biblioteca realizou mais um projeto. Recebeu as crianças de uma creche da cidade, a "Casa da Criança", para apresentar vídeos e livros sobre o meio ambiente, mais especificamente, sobre a biodiversidade. Depois, Fatinha e eu começamos a trabalhar em cima do teatro de fantoches que os alunos da Quintal das Artes apresentarão na Semana do Livro, na biblioteca.
A noite de sexta-feira não prometia nada demais. O remédio me deixou extremamente lento, devagar, e eu cheguei até a sentir a perda de alguns reflexos. Peguei um suco no posto e na hora de entregar o dinheiro. entreguei o suco para o rapaz. Depois, ele perguntou se eu queria que ele abrisse. Eu disse que sim e não entreguei a garrafa pra ele. #tenso. Che estava de John Móvel. Lis apareceu também. Fomos dar uma volta e paramos no Deoclides. O bar estava lotado e não tinha mesa vaga. Lembrei o Che do que ele tinha dito sobre ir para Santa Rosa, uma cidade vizinha, no sábado. Ele disse que topava ir naquela hora. Topamos e lá fomos nós. Ajudei no combustível e pegamos a estrada no John Móvel. Lis ficou, porque precisava resolver uns problemas. Sabíamos que era um pouco arriscado. Fazia tempo que o John Móvel não era testado neste tipo de situação. Na estrada escura, poucos carros cruzavam conosco. Ouvíamos música no meu celular, já que o John Móvel ainda não tem som. Teve Van Halen, Cranberries e Culture Club, a banda do Boy George. Chegamos. Nossa, não ia a Santa Rosa há mais de 10 anos. Assim como o Che, tenho familiares que moram lá, mas já tinha avisado pra ele: nada de contatos familiares naquela noite! Mesmo assim, ele quis passar na frente da casa do seu avô, para mostrar para mim o bosque onde brincava quando era criança, o seu quintal. O avô dele estava na calçada e aí não teve jeito. Conheci o avô, uma tia e uma prima do Che. Estava muito sem graça, mas todos foram muito simpáticos.
Encerrada a visita familiar, continuamos o tour pela cidade a bordo do John Móvel. Chegamos no centro da cidade, na praça da igreja Matriz, onde os pais do Che se casaram. Lá existem muitos bares e lanchonetes em volta. Tinha muita gente, bonita e bem vestida. Descemos do carro e fomos dar uma volta. Rolava um som numa choperia. Andamos um pouco e, quando paramos, avistei alguém num banco da praça, perto de nós, que me chamou a atenção. Era muito interessante e olhei até ser correspondido. E fui. A troca de olhares rolou durante uns 10 minutos, enquanto conversava com Che. O outro lado também era uma dupla. Você fica nessa de olhar até ter certeza do que é que está acontecendo, e quando saca o que é, alguém tem que se mexer. Levantou e saiu. Saí atrás, descemos a rua. Nessa hora, já estávamos sozinhos. Primeiro, rola uma conversa.
Oi! Oi, tudo bem? Tudo bem e você? Tudo bem! Que bom! E aí? E aí, tudo bem?... ah eu já perguntei se estava tudo bem... Quantos anos você tem? 22! E você? 25! Você mora aqui? Não! Eu também não! Sério? Sim.
Éramos duas pessoas de fora, tentando passar um final de semana diferente.
Você namora? Não! E você? Ah, mais ou menos estou enrolado com uma pessoa que também é de fora, mas não está dando certo. Namoro a distância é complicado.
E fala, fala, até que: e agora? Não tem mais nada pra falar. Os olhares se cruzam, dessa vez mais apertados e mais assustados. Há um silêncio, mas rola uma música nos ouvidos uma música particular. Os dois vão chegando perto e o beijo rola, lento, um tiro no escuro. Depois clareia tudo e fica mais quente, e mais seguro. Foram 20 minutos de carinho. O coração aguenta isso tudo? Não tô falando de paixão, mas sim de química, aquela que faz o coração bater mais rápido, o sangue passar apressado pelas veias. Tem aquela vermelhidão no rosto. Você pensa que o mundo é seu, e esquece de tudo. Trocamos telefones. No meio do caminho de volta a civilização, mais um beijo. E tudo ficou na promessa do que poderá ser da noite seguinte, se haverá outro encontro, antes do riacho seguir seu curso normal, e a lua mudar.
Encontrei o Che, que me esperou numa outra rua, abastecemos o John Móvel e pegamos a estrada de volta pra casa. Agora rolou AC/DC, Stones, Beatles e Janis Joplin. Che me deixou em casa. Ele não topou comer lanche. Era 1 e meia da manhã. Entrei em casa, comi uns salgadinhos. 2 e 20 da manhã, antes de desligar a TV, recebi uma mensagem no celular: "Adorei ter conhecido você. Quero muito te ver amanhã. Bjos".
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