
Apresentamos naquele ano o musical "Casa de Brinquedos". No começo dos ensaios, fiquei tímido sim, receoso, mas fui me soltando, até que comprei o cd com as músicas da peça e numa tarde na casa de uma amiga minha, montei a coreografia da "Bicicleta". Cheguei no ensaio naquela noite e disse pro Paulo que tinha algo pra mostrar pra ele. Foi só a primeira. Algumas coreografias da peça fui eu que montei. Eram simples, infantis, mas me orgulhava tanto delas. No ano seguinte, veio mais um musical, dessa vez, "A Arca de Noé". No cartaz da peça, em vermelho, vinha escrito "Coreografias de José Ono Junior". Eu tinha 14 anos e não tinha noção do tamanho disso.
Nessa época, o Grupo Curtura continuava seus projetos. As peças eram mais bem produzidas, tinham figurinos especiais, iluminação, e uma estrutura bem diferentes das pecinhas que a gente fazia na Escolinha de teatro. Eu assisti "Uma Serpente no Seio de Roma" e pensei que um dia iria conseguir chegar ali, trabalhar naquele grupo, com aqueles atores e aí sim eu seria importante.
Minha trajetória no teatro continuou. Em 2001, montamos "Tribobó City". Fiz o "El Mexicano", até hoje um dos personagens que mais gostei de fazer. Numa apresentação para a escola Alfredo Guedes, lembro das crianças correndo atrás de mim nos fundos do Centro Cultural e gritando "los indios, los indios" e pedindo autógrafo hehe. Foram meses andando pela cidade e ouvindo gente gritando o bordão do Mexicano. Em 2002, fizemos leituras de uma peça de Domingos de Oliveira, "Somos Todos do Jardim da Infância". Adorei o texto e gostei logo de cara do personagem "Felipe". Mas a peça não aconteceu. A escolhida foi um clássico de Molière, "O Médico a Força". Nunca vi um público rir tanto quanto nessa peça. Era gargalhada do começo ao fim. Mutreta e eu éramos uma dupla infalível nessa época, mesmo vivendo às turras. Era ego demais num grupo só.Logo depois, um novo desafio, "Édipo Rei", tragédia grega de Sophocles. Fazia o "Tirésias". Usava uma maquiagem pesada. Raspei a sobrancelha e o cabelo. Tirésias era cego e da boca dele saía a perdição de Édipo. Com essa peça, encarei meu primeiro festival de Teatro, em Pirassununga, o que não foi uma experiência boa. Era importante demais pra mim e o nervosismo já me tirava do sério.
No ano seguinte, veio minha primeira apresentação como "Herodes", na Paixão de Cristo.

Passei 5 anos em São Paulo, 3 deles estudando. Fiz várias peças com a escola e uma profissional apresentada durante 3 meses no Espaço dos Satyros. Participei de muitos testes, fiz teste até na Globo hehe, atuei num curta-metragem, muita história que nem caberia aqui agora. Trabalhei com telemarketing também durante um tempo, e passei também muito tempo como ator desempregado. Cresci muito como pessoa durante esses 5 anos. Me apaixonei muitas vezes, quebrei muito a cara, vi meus sonhos surgirem e escoarem pelo ralo várias vezes. Durante esse tempo, ainda fiz alguns trabalhos com o Paulo. Ministrei alguns laboratórios com os atores e participei do grande sucesso do Curtura, "A Gaiola das Loucas". Em 2008, voltei para Tambaú.
Estava perdido, com uma mão na frente e outra atrás, sem amigos, sem nada.

Em 2009, o teatro se fez ainda mais presente. Passei em um concurso da prefeitura e dei aulas de teatro nas escolas durante 6 meses, até quando o projeto acabou. Na SAT, continuei trabalhando com o Paulo, assumindo maiores responsabilidades. Foi sofrível no começo. Tinha medo, me sentia despreparado. Me formei como ator, e não como diretor, e a ideia de aprender assim, na raça, me assustava demais. Fui me adaptando aos poucos ao grupo, ganhando intimidade, me soltando, e o medo foi passando. Nesse ano, dirigi junto com o Paulo a peça "Tribobó City", a mesma que atuei em 2001. A peça foi bem musical e agradou muito as crianças que prestigiaram. Além dessa, também me apresentei com "Confissões de Adolescente", onde contracenei com as meninas do grupo. Era pai delas, foi uma experiência ótima.
Em 2010, o trabalho na Quintal das Artes seguiu em frente. No início do ano, surgiu "Sexo dos Anjos". Lembrei daquele antigo sonho de atuar no Grupo Curtura. Já tinha passado por ele, umas 3 vezes antes, mas essa foi especial, o melhor texto que já encenei. Tenho recordações dos ensaios, das apresentações, muito vivas dentro de mim. Foi tudo muito forte e essa peça nos orgulha muito. Além de trabalhar na biblioteca, as aulas no grupo de teatro continuaram. Um dia, Paulo me questionou sobre a peça que faríamos nesse ano. Me lembrei de "Somos Todos do Jardim da Infância", do quanto que gostava do texto. Sugeri que transformássemos

Dia 25 de novembro de 2010! Chegou o dia da estreia. Vivi dias muito difíceis em 2010, com muitas perdas e desilusões, como acontece com todo mundo. Ainda é hora de crescer. Tem dia que acordo e vejo que não sei nada da vida, nem de mim. Os últimos dias foram de bomba-relógio. Pensei em alguns momentos que iria explodir. No dia da estreia, saí mais cedo da biblioteca. Fui pra casa, dormi bastante. Acordei muito nervoso, deprimido. Me tranquei no quarto, liguei o som. Cantei, cantei muito. Alegria, alegria; Soy loco por ti America, I want to hold your hand, Call me, Hey Jude... Me acalmei. Pensei em tanta coisa. também não caberia aqui. Coração estava em frangalhos, sem força, batendo ora rápido, ora devagar. Na SAT, andei de um lado para o outro. Todos estavam nervosos, a sua maneira. A peça começou. Meus pais estavam na plateia, e tivemos um público muito bom nessa noite. A voz do José Eli narrando as falas do autor veio primeiro. Logo depois, "We go together", do filme Grease, que sempre me encheu os olhos. E aí foi... Os meninos na sala de aula, tomando sorvete na Milka, dançando Elvis com as meninas na festinha. Veio a triste cena de desamor com Isabelle e Gabriel, sensibilizando. Depois, o xodó "Biquini de bolinha amarelinho" com as queridas Camila e Carolzinha, segurando as revistas Cláudia, tão coloridas e ousadas. "O bom" Neto fez graça no cinema, e depois do beijo, veio o tapa com o "Splish Splash". Os hilários Marco Antonio e Tales tomando um tenso café desigual, procurando solução para aqueles problemas tào complexos. O baile de formatura funcionou como panela de pressão para aqueles personagens. Claudinha surgiu, com nome de flor, trazendo beleza e perfume. Juliano tentando ganhar o primeiro beijo para seu personagem, mas o tiro saiu pela culatra, com o soco que levou do cadete, namorado da Norma. Veio a hora do "Rock around the clock", logo depois, a descoberta do amor com "Can't take my eyes off of you". Ane Caroline, nossa grande Carol, surgiu de vestido vermelho na frente da lua, que era poste. A tensão do vestibular com os delírios de "Get Back", dos Beatles, que apareceram bastante no espetáculo com "Hey Jude", "Let it Be", "Yesterday" e "I want to hold your hand", que relembrou os momentos dessa turma para plateia numa mistura de cinema e teatro.
Minha sensação é de que poderia ter trabalhado mais, ter deixado tanto de insegurança, e ter caído de cabeça na peça mais cedo, mas Deus entra de novo na história, e Ele sabe o que faz. O trabalho está aí, cumprido, e todos nós somos do jardim da infância, na hora de comemorar nossos êxitos. A arte liberta, conforta, nos inspira, nos faz crescer, compreender, aguentar. E eu rezo pra que ela esteja comigo, em minha vida, até o último dia, e que esse seja sempre o meu caminho.
Hoje ainda temos espetáculo, a última apresentação. E a noite ainda guarda muitas surpresas e muita emoção pra todos nós. E a nossa história nesse riacho da vida continua...
"Estou aqui de passagem. Sei que adiante um dia vou morrer de susto, de bala ou vício, num precipício de luzes, entre saudades, soluços. Eu vou morrer de bruços, nos braços, nos olhos, nos braços de uma mulher. Mais apaixonado ainda, dentro dos braços da camponesa, guerrilheira, manequim, ai de mim, nos braços de quem me queira."
"Eu vou, por entre fotos e nomes, os olhos cheios de cores, o peito cheio de amores vãos. Eu vou, por que não?"
3 comentários:
Zé, ficou muito bacana, os meninos capricharam, é muito interessante a gente ver os talentos e as inclinações desabrochando... Cara, o que é a Carol, boa, mas boa pa caceta, a Matilde saiu da Carol, a Matilde foi a personagem feminina com mais identidade própria... ah, caralho, sei lá se tou me fazendo entender, mas é isso, hahahah!!! Gostei pa caramba e penso cada vez mais em dar uma surtada com esse povo daqui de casa e voltar ao teatro... Cê munto de parabéns, viu!!!
Adorei o texto e as fotos tão expressivos. Tenho uma paixão ardente pelo teatro. Escrevo peças para participar desta linda e rica ousadia.
bjs
Estou orgulhoso não só de ver como o menino "avião" da Casa de Brinquedos, que nos olhava acanhado na oficina "quintal das Artes" do meu pai, tornou-se um grande ator, um ótimo diretor e um amigo para sempre, além do Jardim da Infância. Parabéns, José.
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